Por Greovário Nicollas
Se há algo que Brasília ainda consegue produzir em larga escala, além de crise, é ironia involuntária. E poucas cenas representam tão bem essa vocação quanto o velório político da tal “anistia ampla, geral e irrestrita” que naufragou no Congresso. Enquanto isso, no canto da sala, com cara de quem ouviu passos atrás da porta, está ele: Flávio Bolsonaro, o senador que descobriu que coragem política é um bem escasso e que mandato é mais precioso que ouro.
Aliás, falar em “lançar Flávio Bolsonaro à Presidência da República” é quase uma performance de humor involuntário. Aquelas típicas cenas em que todo mundo finge acreditar, mas ninguém acredita de verdade. Tem cheiro, cor e textura de blefe. Primeiro, porque Flávio não quer. Segundo, porque Flávio morre de medo de ficar sem mandato e quem o culpa? Depois de tantos anos usufruindo do kit completo da vida parlamentar, o medo de voltar à normalidade deve ser quase uma fobia clínica. E, convenhamos: dentro da trupe familiar, Flávio é o mais maleável dos Bolsonaro. Maleável, claro, até onde “maleável” significa não pular da janela achando que voa. Porque, de resto, a família tem um histórico de declarações que faz qualquer biruta — não a de aeroporto, mas a do manicômio se sentir subestimada.
Quando tentaram empurrá-lo para uma pré-campanha presidencial, ele tropeçou nas próprias palavras. Mal entendera em que enrascada estava se metendo e já falava em “moeda de troca”, “preço” e tudo mais que um político não deveria verbalizar na frente de microfones. Foi um espetáculo: uma pré-candidatura que nasceu do nada, cresceu rumo a lugar nenhum e terminou antes de começar. A verdade é simples como um boletim de ocorrência: Flávio tem pavor de perder o mandato e, com ele, todos os benefícios que orbitam o seu universo político há anos. É o tipo de apego que emociona, se você for roteirista de comédia.
No fim das contas, Flávio Bolsonaro é quase um presente embrulhado e entregue pelo PL (Partido Liberal) e direita ao governo Lula. Um daqueles presentes que o destinatário abre sorrindo, porque sabe que vai ser útil. É um adversário perfeito para Lula, alguém que agrega, polariza pouco e ainda ajuda a consolidar a narrativa de que o ex-capitão não só perdeu força, como perdeu rumo. E enquanto o PL se concentra em fabricar candidatos com o mesmo entusiasmo com que Brasília fabrica crises, Lula segue reabilitado, forte e conduzindo seu voo de brigadeiro rumo ao 4º mandato, suavemente, como quem já percebeu que o céu está cada vez mais limpo. A anistia morreu no Congresso. Mas o desespero por um mandato vive e muito nas bandas do clã Bolsonaro.
Articulista, Periodista e Colaborador do BLOG DO EDNEY.
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