A relatoria do processo ficou a cargo do conselheiro Marcos Loreto, que conduziu a análise com base em critérios técnicos e dados objetivos. No centro da decisão estão falhas consideradas graves e recorrentes, sobretudo o descumprimento das normas constitucionais que tratam do investimento mínimo obrigatório em educação e o não recolhimento integral das contribuições previdenciárias devidas pelo município.
Os números apresentados no julgamento reforçaram a gravidade da situação. Mesmo após ajustes e retificações levadas ao processo pela defesa, permaneceram pendências expressivas: aproximadamente R$ 466 mil deixaram de ser repassados ao Regime Geral de Previdência Social, enquanto o débito com o Regime Próprio ultrapassou a marca de R$ 5 milhões. Para o Tribunal, trata-se de um passivo incompatível com uma gestão fiscal responsável.
A tentativa de justificar as irregularidades com base em uma suposta crise financeira também não prosperou. Dados analisados pelo TCE demonstraram crescimento contínuo das receitas municipais ao longo dos últimos anos, alcançando mais de R$ 170 milhões em 2023. O argumento de escassez de recursos perdeu força diante desse cenário, especialmente quando confrontado com gastos superiores a R$ 1,3 milhão destinados a festividades, apontados no processo como exemplo de prioridades questionáveis.
No campo da educação, outro ponto sensível, o Tribunal concluiu que o município não conseguiu comprovar a compensação integral de valores que deixaram de ser aplicados em exercícios anteriores. Mesmo após as correções apresentadas, restou um déficit de quase R$ 193 mil, o que reforçou a avaliação negativa sobre o cumprimento das obrigações legais.
Com a manutenção da rejeição, o processo segue agora para a Câmara de Vereadores de Bom Conselho, a quem cabe o julgamento político das contas. E é nesse ponto que o caso ganha contornos ainda mais delicados. O Legislativo municipal possui maioria alinhada ao grupo político do ex-prefeito João Lucas, liderado pelo deputado estadual Dannilo Godoy, o que transforma a análise das contas em um teste de coerência institucional.
O contexto se torna ainda mais sensível porque o próprio TCE já manteve, também por unanimidade, a rejeição das contas de outro exercício ligado ao mesmo grupo político, referente à gestão de Dannilo Godoy quando prefeito do município. Assim, os vereadores se veem diante de uma encruzilhada: acatar a orientação de um órgão técnico e constitucionalmente responsável pelo controle das contas públicas ou contrariar o Tribunal para preservar alianças e lideranças locais.
Entre o parecer técnico e o cálculo político, Bom Conselho assiste a mais um capítulo de uma história conhecida. O desfecho, oficialmente, ainda está em aberto. Mas, nos bastidores, a expectativa é de que a decisão do Legislativo revele muito mais do que uma simples análise contábil — revelará, sobretudo, o peso que a política local está disposta a dar à responsabilidade fiscal.
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