Editorial do Jornal do Commercio deste sábado (19)
Entre as nossas mais urgentes dívidas sociais, a saúde deveria ter um tratamento de UTI, com prioridade absoluta, ocupando o primeiro lugar da lista. Ela implica em sobrevivência, com qualidade. Sem uma boa assistência à saúde, a indigência da parcela da população majoritária dependente do poder público se manifesta como um dos mais visíveis componentes da fratura social que reduz a cinzas o ufanismo de estarmos entre as seis ou sete mais ricas nações do mundo. O que nada significa quando temos, de um lado, a parte que pode custear a qualidade de vida, de outro, a que enfrenta as mais terríveis dificuldades para ter acesso a um serviço elementar, vital, que lhe deveria ser assegurado pela força da Constituição, e é, mas com graves ressalvas.
Dentro desse cenário, uma questão se mostra dolorosa para as vítimas, os pacientes, e incômoda para o resto da população, para o Estado brasileiro e Pernambuco em particular: é o caso dos doentes renais, que precisam ter o sangue filtrado, por hemodiálise. Os depoimentos de matéria recente deste jornal comovem e são indicadores do tamanho das dificuldades por que passam as pessoas que precisam de atendimento e ainda são insuficientes para se ter ideia da dramática condição de doentes que são transportados várias vezes por semana de uma cidade para outra a fim de terem o atendimento que sua cidade de origem não tem.
Ninguém pode ter a pretensão de estimar o sofrimento dos doentes renais sujeitos a hemodiálise, mas, por aproximação, seria desejável que nossas autoridades não apenas da área de saúde, mas de uma maneira geral, executivos, legisladores, membros do Judiciário, todos tirassem um dia, um só dia, para viajar em um desses carros que circulam 200, 300 quilômetros para levar doentes a sessões de hemodiálise. É uma viagem de horrores, pela proximidade do sofrimento.
A isso que deveria ser suficiente para uma revolução na maneira de pensar o problema se acrescenta um custo social, pago por toda sociedade, sem a clareza e a razoabilidade necessárias. O procedimento de transferir pacientes através de longas estradas, em condições precárias, ocupando clínicas privadas representa um custo alto e deveria passar por um tratamento de emergência, com uma forma absolutamente nova de ser visto, independente do custo, por ser uma daquelas dívidas sociais que escandalizam a consciência nacional.
Sobretudo deve prevalecer o entendimento de que essa é uma questão que não pode ser tratada apenas como um Tratamento Fora do Domicílio (TFD), como está inscrito nos carros das prefeituras que transportam os pacientes para a hemodiálise, um transporte pago pelo governo federal. Seria o caso de se perguntar se não seria mais econômico e humanamente desejável que o custo do transporte fosse aplicado em equipamentos e treinamentos para que cada cidade tivesse seu atendimento. Uma pergunta cuja resposta nos tão óbvia que dispensa comentário. Exceto quando posta perante autoridades que realçam custos imprevistos e, por isso, serviços não realizados.