A leitura pública do documento foi feita pelo próprio Flávio Bolsonaro na porta do hospital DF Star, em Brasília, poucas horas antes do procedimento cirúrgico marcado para a manhã desta quinta-feira. O cenário, marcado pela expectativa em torno da saúde do ex-presidente, conferiu forte carga simbólica ao anúncio, associando a transição política a um momento pessoal delicado.
Intitulada “Carta aos Brasileiros”, a mensagem mistura balanço pessoal, discurso político e a tentativa de organizar o futuro do movimento que Bolsonaro lidera desde sua ascensão nacional. Logo no início, o ex-presidente afirma ter enfrentado “duras batalhas” após deixar o Palácio do Planalto, mencionando custos elevados à sua saúde e à sua família. Sem detalhar processos judiciais ou decisões recentes, ele classifica o contexto atual como um “cenário de injustiça” e diz agir para impedir que “a vontade popular seja silenciada”.
É nesse ponto que Bolsonaro torna pública a decisão de indicar Flávio Bolsonaro como pré-candidato à Presidência. Segundo o ex-presidente, trata-se de uma escolha “consciente e legítima”, sustentada pela necessidade de preservar os princípios que, em sua visão, mobilizaram milhões de apoiadores ao longo de sua trajetória política. Ao justificar a indicação, Bolsonaro afirma que o senador foi escolhido para a “missão de resgatar o nosso Brasil” e representar a continuidade de seu projeto.
A carta reforça a ideia de herança política direta ao afirmar que Flávio simboliza “a continuidade do caminho da prosperidade” iniciado por Bolsonaro antes mesmo de assumir a Presidência. O texto também recupera pilares centrais do bolsonarismo, como a defesa da autoridade, da ordem e de valores conservadores, ao sustentar que o país precisa ser conduzido “com justiça, firmeza e coragem”, em sintonia com o que define como “os valores do povo brasileiro”.
O encerramento da carta traz uma invocação religiosa, marca recorrente nos discursos do ex-presidente, ao pedir que Deus abençoe e capacite Flávio Bolsonaro na liderança de uma “corrente de milhões de brasileiros” que defendem “a pátria, a família e a liberdade”. A mensagem busca, assim, reforçar a conexão emocional e ideológica com sua base eleitoral.
Nos bastidores da política, o gesto é interpretado como uma tentativa clara de reduzir disputas internas no campo da direita, onde diferentes nomes vinham sendo cogitados como possíveis herdeiros do capital político de Bolsonaro para 2026. Ao registrar sua escolha por escrito e torná-la pública em um momento de grande visibilidade, o ex-presidente procura consolidar Flávio como principal referência do bolsonarismo no próximo ciclo eleitoral.
A cirurgia, motivada pela correção de hérnias abdominais e relacionada às sequelas do atentado sofrido em 2018, adicionou peso simbólico à divulgação da carta. Mais do que um comunicado político, o documento funciona como um marco de transição: Bolsonaro, mesmo afastado das urnas, sinaliza que pretende seguir influente, organizando desde já o futuro do grupo que construiu ao longo de sua trajetória.