Divisão no bolsonarismo escancara crise estratégica após protesto com bandeira de Trump na Câmara
Na manhã desta terça-feira (22), um protesto liderado por deputados da oposição na Câmara dos Deputados acabou revelando uma fissura interna entre as diferentes correntes do bolsonarismo. A cena que gerou desconforto aconteceu durante uma coletiva de imprensa convocada em resposta à decisão do presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), de vetar sessões de comissões que prestariam homenagem ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). No centro da polêmica, a exibição de uma bandeira de campanha do presidente americano Donald Trump por parlamentares da ala mais radical da direita brasileira.
Os deputados Delegado Caveira (PL-PA) e Sargento Fahur (PSD-PR) foram os responsáveis por erguer a bandeira de Trump diante das câmeras, como uma forma de protesto simbólico contra o que classificaram como censura política. No entanto, o gesto não foi bem recebido nem mesmo dentro do grupo oposicionista. O deputado Zucco (PL-RS), que ocupa a liderança da oposição, repreendeu publicamente os colegas. “Estou te pedindo por favor para não fazer isso. Pode prejudicar”, disse, visivelmente constrangido, enquanto tentava conter os ânimos e preservar a narrativa política do grupo.
O desconforto se explica: a associação direta com Trump, neste momento, é vista como problemática por uma parte dos aliados de Bolsonaro. A recente imposição de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros pelos Estados Unidos acendeu o alerta em Brasília, especialmente após a Polícia Federal apontar que reuniões mantidas por Jair e Eduardo Bolsonaro com autoridades americanas teriam contribuído diretamente para a aplicação do “tarifaço”. Embora o ex-presidente tente se dissociar das consequências dessas tratativas — “Não tem nada a ver com a gente. Querem colar na gente os 50%. Mentira”, disse ele —, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) reconheceu, na segunda-feira (21), que o tema foi sim abordado em seus encontros diplomáticos nos EUA.
A leitura feita nos bastidores é de que o bolsonarismo tenta evitar, a todo custo, ser responsabilizado pelas perdas econômicas geradas pelas sanções comerciais americanas. Exibir a bandeira de Trump em um momento como este, portanto, vai na contramão da estratégia de defesa do grupo, que busca manter sua base mobilizada enquanto minimiza os danos à imagem pública. Internamente, o ato foi considerado um “tiro no pé”, segundo relato de um assessor parlamentar próximo ao núcleo do PL.
Além da bandeira, o protesto incluiu também a colocação de uma placa com o nome de Bolsonaro sobre a mesa principal do plenário. Mais uma vez, o gesto gerou desconforto. O deputado General Pazuello (PL-RJ), presente no ato, alertou os colegas de que aquele tipo de manifestação poderia “dar problema” e acabar sendo interpretado como quebra de decoro. A advertência serviu como freio para novas ações mais teatrais que vinham sendo cogitadas entre os parlamentares da oposição.
Já o líder do PL na Câmara, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), reagiu à decisão de Hugo Motta com tom de indignação. Classificou como “ilegal” o impedimento das comissões e acusou o presidente da Casa de censura política. Apesar da retórica inflamada, a liderança do partido tem tentado conter os impulsos mais radicais do grupo, temendo que gestos como o da bandeira de Trump fragilizem a narrativa construída em torno da perseguição política ao ex-presidente.
O episódio também expôs uma disputa por protagonismo entre os diferentes polos da direita bolsonarista. De um lado, os parlamentares mais performáticos, como Caveira e Fahur, apostam na radicalização simbólica como forma de manter visibilidade. De outro, líderes como Zucco e Sóstenes tentam manter uma linha de ação mais institucional, especialmente diante do cerco jurídico que se fecha em torno de Jair Bolsonaro e seus aliados.
A decisão de Hugo Motta de cancelar as sessões foi vista pela oposição como um recado duro do centro político ao bolsonarismo. Ao mesmo tempo, a resposta descoordenada da oposição revelou um cenário interno de disputas, improvisos e contradições, num momento em que a coesão do grupo é essencial para resistir à pressão institucional e à investigação da Polícia Federal, que promete novas revelações sobre os bastidores da relação entre a família Bolsonaro e o governo de Donald Trump.
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