Lembra o carnaval (2010), quando Dilma Rousseff era pré-candidata e ela veio para o Galo? Quando cheguei no camarote, recebi a informação de que só podia entrar sozinho, sem as pessoas do nosso núcleo de confiança e que ajudaram na eleição do prefeito. A imprensa, naquela hora, também foi barrada. Eu fiquei muito incomodado, subi “na tora” e perguntei a Félix Valente (então chefe de gabinete do prefeito) de quem era aquela orientação. Ele disse que era do prefeito. Então, eu dei um abraço em Dilma e fui embora rápido.
Finalmente qual foi o mistério, o segredo tão bem guardado entre João Paulo e João da Costa, o fato grave entre os dois que detonou a amizade, a ligação político-pessoal que preservaram durante os dois mandatos do deputado? Pois João Paulo veio agora, depois de tanto tempo, detalhar fatos que mais ou menos explicam o que realmente houve entre os dois. Excelente entrevista feita porAline Moura, no DP, publicada neste domingo, desnuda muita coisa, com narração do próprio João Paulo. Eis alguns trechos da entrevista:
Dizem que o senhor queria mandar na prefeitura.
Sim, mas o que é que eles iam dizer, se não fosse isso? Tinha que ter algum argumento para justificar o rompimento. Ele sabe disso e sabe que nunca quisemos intervir no governo. Ele sabe porque conviveu comigo, sabe qual é a nossa formação, de diálogo, de descentralizar. Queríamos contribuir, o que era normal. Talvez, a única forma de ele se consolidar como líder fosse o rompimento comigo. A sociologia explica que isso pode acontecer com uma pessoa que se elege num grau de dependência muito grande. Talvez, ele não soube administrar o sucesso e a importância política que tem o prefeito do Recife.
O começo de tudo
Acho que começou com o não atendimento de telefonemas, com o distanciamento que ele estava tendo com alguns secretários e que começou a virar perseguição. Esses elementos foram suficientes para o distanciamento e se concretizou com a saída de muitos companheiros do governo, como Lygia Falcão, que era companheira do nosso núcleo de confiança…
Planos para pós-eleição
Quando saímos do governo no final de 2008, a ideia era criar um núcleo para discutir as dificuldades da prefeitura, as crises e nós iríamos continuar pensando numa questão estratégica para o estado e para o país. Iríamos discutir aquelas questões de alta relevância de forma estratégica como era antes.
Ele parou de atender a telefonemas?
Na verdade, sou muito assim: tenho uma relação de respeito. Eu ligo para uma pessoa duas, três, quatro vezes, mas, se a pessoa não liga, paro de ligar. Acho que houve esse distanciamento ao longo do tempo e, a meu ver, foi se agravando ainda mais, inviabilizando uma possibilidade de aproximação e de apoio à reeleição.
A primeira-dama, Marília Bezerra, teve algo a ver com essa crise entre vocês dois?
Falam muito que teve, mas não existe uma situação que possa comprovar isso, até porque elegemos João da Costa e não Marília. Por isso, nossa relação, por princípio, tinha que ser com ele. Acho que querer responsabilizar Marília é um erro, porque quem é o prefeito não é ela.
João da Costa disse ter semelhanças com Dilma, é um perfil mais técnico, mais tímido…
Primeiro, a formação de Dilma é de uma mulher que participou de uma organização comunista, revolucionária, que foi presa e torturada. Ela é uma mulher que está fazendo uma excelente gestão e tem uma alta popularidade, uma mulher que, apesar de todas as dificuldades com o Congresso, tem encantado o Brasil e feito um contraponto a uma prática política que é vivida por muita gente. A outra característica de Dilma é a lealdade e Lula me afirmou isso: “João Paulo, você precisa ver a Dilma. Essa mulher é tão leal que às vezes eu fico incomodado”. Então, sinceramente, não vejo semelhança nenhuma (entre ela e o prefeito).
Justificativas
As dificuldades recaem principalmente na política. Temos o claro entendimento das dificuldades que os secretários têm de serem recebidos pelo prefeito, a dificuldade dele com a Câmara, com os movimentos sociais, com os servidores e nós sentimos que houve uma quebra significativa, uma queda da autoestima grande na cidade e na gestão. Houve uma ruptura dentro do próprio governo com a saída de vários secretários do PT e do PTB. Há uma preocupação não só minha, mas do governador e de Humberto Costa que, se ele continuar, há perspectiva de se quebrar a Frente Popular. Foi essa a impressão que levou companheiros como Humberto a sair do governo e colocar a candidatura de Rands
Por que Rands e não João Paulo ou João da Costa
Mesmo sabendo que eu tinha 51% das intenções de voto e a preferência da população, eu não tinha as condições internas para disputar as prévias. Eu podia confiar que o sentimento da sociedade contagiasse a parte cartorial do partido, mas isso seria um risco. Então, acho que Rands construiu melhor essa condição (no partido) e tenho o sentimento de que ele pode fazer um governo de esquerda que extrapola os limites de uma boa gestão.
''Chutou por fora numa barra sem goleiro''
O atual prefeito teve as maiores condições que um prefeito já teve nessa cidade. Pegou um governo com 88% de aprovação, com apoio dos governos estadual e federal, com apoio de uma Frente, mas, falando na linguagem do futebol, ele estava na marca do pênalti, numa barra sem goleiro e ainda conseguiu chutar para fora
Esse é um momento extremamente delicado. Mas as prévias serão não só um momento de formação da nossa militância, mas a oportunidade para a sociedade perceber que há necessidade de fazer a troca do prefeito.
Magno Martins
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