terça-feira, 13 de maio de 2025

INQUÉRITO DO EX- PREFEITO GERALDO JÚLIO SOBRE FRAUDES NA PANDEMIA CHEGA AO TRF-5

O inquérito que investiga o ex-prefeito do Recife, Geraldo Júlio (PSB), no âmbito da Operação Desumano, ganhou novo rumo após a Justiça Federal encaminhar o caso ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5). A mudança ocorreu por solicitação do Ministério Público Federal (MPF), com base em entendimento recente do Supremo Tribunal Federal (STF), que assegura foro privilegiado a ex-prefeitos quando os fatos sob apuração têm relação direta com o exercício do cargo. A investigação tem como foco principal suspeitas de fraude na contratação emergencial de uma Organização Social de Saúde (OSS) para atuar no enfrentamento da pandemia de covid-19, durante a gestão de Geraldo Júlio na Prefeitura do Recife e também envolvendo agentes públicos da cidade vizinha de Jaboatão dos Guararapes.

A Operação Desumano foi deflagrada em setembro de 2020 pela Polícia Federal e trouxe à tona indícios de irregularidades graves em contratos de gestão firmados com a OSS, cuja estrutura e capacidade técnica eram consideradas incompatíveis com a complexidade dos serviços contratados. A entidade, segundo as apurações, firmou contratos vultosos com os municípios durante o pico da crise sanitária, mas terceirizou a execução dos serviços de forma irregular, desrespeitando normas legais e técnicas previstas na legislação que regula as parcerias com o poder público. Os contratos, segundo a Polícia Federal, somavam quase R\$ 58 milhões, valor que representa significativa parcela dos recursos repassados pelo governo federal às duas cidades pernambucanas no auge da pandemia.

O Recife, até agosto de 2020, recebeu aproximadamente R\$ 95 milhões oriundos do Fundo Nacional de Saúde, enquanto Jaboatão dos Guararapes foi contemplado com R\$ 32 milhões no mesmo período. Parte desses valores teria sido destinada à OSS investigada, levantando suspeitas sobre o desvio de recursos públicos em plena emergência sanitária. Em 2023, o MPF chegou a denunciar 11 pessoas supostamente envolvidas no esquema, incluindo gestores, empresários e representantes da organização contratada, mas a Justiça Federal decidiu rejeitar a denúncia, o que não encerrou a apuração nem desfez os elementos colhidos nas investigações.

Mesmo com a rejeição inicial, o MPF persistiu no caso e buscou o TRF-5 para dar seguimento ao inquérito com base no foro por prerrogativa de função, tentando garantir o prosseguimento das diligências contra o ex-prefeito e outros envolvidos. Os autos do processo apontam que os contratos firmados com a OSS não apenas apresentavam vícios de legalidade como também evidenciavam falhas graves de planejamento e execução. Documentos obtidos durante a operação indicam que a organização, mesmo sem estrutura técnica comprovada, recebeu antecipadamente valores expressivos e repassou parte da responsabilidade a empresas subcontratadas sem a devida fiscalização do poder público.

As suspeitas levantadas na Operação Desumano não se limitam à legalidade dos contratos, mas também envolvem a real destinação dos recursos, o superfaturamento de insumos e a contratação de serviços com preços acima dos valores de mercado. O inquérito descreve um cenário de descontrole administrativo, no qual as exigências legais foram flexibilizadas sob o argumento da urgência sanitária, mas sem que houvesse a devida cautela na seleção da entidade responsável por operacionalizar os serviços de saúde. A falta de critérios técnicos e a ausência de transparência foram apontadas como facilitadores do possível uso indevido dos recursos públicos, agravando a crise vivida pelos municípios durante a pandemia.

Com o processo agora sob responsabilidade do TRF-5, os desdobramentos jurídicos voltam a movimentar os bastidores da política pernambucana, uma vez que Geraldo Júlio, embora atualmente afastado dos holofotes, ainda exerce influência no PSB e no cenário estadual. O caso reacende o debate sobre o uso dos recursos federais destinados à saúde em caráter emergencial e a fragilidade dos mecanismos de controle durante momentos críticos como o enfrentado em 2020. A apuração sobre os contratos segue em curso, sob sigilo parcial, e pode resultar em novas fases da investigação, caso sejam confirmadas as suspeitas de conluio entre agentes públicos e privados no esquema. A matéria foi publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo.

Nenhum comentário: