quarta-feira, 11 de junho de 2025

AS IRONIAS NERVOSAS DE BOLSONARO PARA CIMA DE MORAES

O depoimento do ex-presidente Jair Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal (STF), realizado sob forte expectativa, revelou um cenário que mistura estratégia jurídica, ironia e tensão política. Investigado como peça central do chamado “núcleo político” da tentativa de golpe de Estado, Bolsonaro compareceu à oitiva munido de uma narrativa de negação absoluta, ainda que confrontado por provas reunidas ao longo de meses de apuração pela Polícia Federal e pela Procuradoria-Geral da República. A delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente, é uma das peças-chave que sustentam as suspeitas de que Bolsonaro teve conhecimento e envolvimento direto em articulações para subverter o resultado das eleições de 2022. No entanto, durante as quase três horas de interrogatório, o ex-chefe do Executivo negou qualquer participação nos atos golpistas e optou por uma postura que mesclou cautela jurídica com momentos de provocação velada.

Diante do ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito no STF e figura constantemente atacada por Bolsonaro ao longo do mandato e após sua derrota nas urnas, o ex-presidente surpreendeu ao suavizar o tom em certos trechos do depoimento. Disse não reconhecer como legítimas as propostas para convocação das Forças Armadas ou retomada do AI-5, chamando de "malucos" aqueles que defenderam tais ideias, numa tentativa de se desvincular de setores mais extremistas da sua base. Em outros momentos, Bolsonaro pareceu adotar o sarcasmo como mecanismo de defesa, como quando mencionou, com riso irônico, ter arrecadado R\$ 18 milhões por meio de doações via Pix, em alusão à campanha de solidariedade que surgiu em sua defesa após o bloqueio de seus bens. Ironizou que teria arrecadado mais do que o Criança Esperança, programa tradicional da Rede Globo voltado para causas sociais.

Em uma de suas declarações mais inusitadas, propôs, em tom jocoso, que o próprio ministro Alexandre de Moraes fosse seu candidato a vice-presidente em 2026, arrancando risos nervosos de quem acompanhava a sessão. A provocação, feita diretamente ao magistrado que simboliza a contenção dos arroubos autoritários do bolsonarismo, teve um efeito calculado, reforçando a linha de atuação do ex-presidente, que busca transformar o processo judicial em palco político. Mesmo assim, não faltaram momentos em que Bolsonaro aparentou hesitação. Em determinadas passagens, pediu desculpas por falas anteriores e evitou os arroubos que o caracterizavam nos palanques e redes sociais. Sua defesa segue apostando na narrativa de que Bolsonaro foi apenas um observador dos fatos, não um articulador.

Apesar da teatralidade e da tentativa de desmoralizar a gravidade das acusações com piadas e comentários irônicos, o ex-presidente foi formalmente interrogado como réu e todas as suas declarações passam agora a compor o conjunto probatório do processo. O ministro Alexandre de Moraes, que conduziu o interrogatório com firmeza, agora aguarda o cruzamento entre provas materiais, delações e versões apresentadas em juízo para avançar na responsabilização penal dos envolvidos. O depoimento de Bolsonaro, mesmo com suas nuances de deboche e recuos táticos, passa a ser parte integrante do quebra-cabeça que busca esclarecer como e por quem foi planejado o ataque ao Estado Democrático de Direito após a eleição de 2022.

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