domingo, 1 de junho de 2025

PELA PRIMEIRA VEZ, CODEVASF NÃO TERÁ UM NORDESTINO NO COMANDO

Criada há 51 anos pela Lei nº 6.088, de 1974, a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) nasceu com um objetivo claro: promover o desenvolvimento regional de forma integrada e sustentável, contribuindo para a redução das desigualdades sociais no semiárido brasileiro. Com foco inicial na bacia hidrográfica do Rio São Francisco, a estatal federal tornou-se símbolo de infraestrutura hídrica, projetos de irrigação, ações ambientais e iniciativas em economia sustentável voltadas especialmente para o Nordeste. Desde sua fundação, a Codevasf foi gerida por quadros políticos e técnicos da região nordestina, criando-se ao longo das décadas uma tradição de que a presidência da Companhia deveria ser ocupada por alguém com raízes locais, com conhecimento profundo das demandas territoriais e da cultura regional. Isso fomentou uma espécie de disputa histórica entre lideranças do Nordeste, especialmente senadores e deputados federais, que viam na presidência da estatal não apenas uma posição estratégica de influência, mas também uma ferramenta para viabilizar projetos estruturantes nos seus estados. Com o passar dos anos, especialmente a partir dos anos 2000, o apetite político em torno da Codevasf se intensificou, impulsionado pelo novo uso que parlamentares passaram a fazer do órgão: a destinação de emendas parlamentares com execução mais célere e maior visibilidade eleitoral. Como consequência desse processo, a atuação da Codevasf foi sendo ampliada por diversas legislações e passou a alcançar outros territórios além do São Francisco, chegando atualmente a 16 estados da federação. Ainda que essa expansão tenha diluído parcialmente o caráter nordestino da companhia, a prática política continuava a garantir que a presidência permanecesse com representantes da região. Exemplo disso é a atual liderança de Marcelo Moreira, baiano, que chegou ao cargo por indicação do deputado federal Elmar Nascimento (União Brasil-BA). Contudo, na última semana, o Governo Federal deixou vazar para a imprensa uma reviravolta: Moreira deixará a presidência da Codevasf e será substituído por Lucas Felipe Oliveira, nome do Amapá, ligado ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre, também do União Brasil. A movimentação gerou desconforto entre políticos nordestinos, já que, pela primeira vez em meio século, a presidência da companhia sairá das mãos de um nordestino. Internamente, a leitura é de que Alcolumbre, hoje um dos principais articuladores do União Brasil, conseguiu ocupar praticamente todos os espaços destinados ao partido no Governo Lula, capitalizando força política especialmente após adiar a instalação da CPMI do INSS. Nos bastidores do Congresso, há quem afirme que o União Brasil, cada vez mais distante do Palácio do Planalto, perdeu o interesse nos cargos do Executivo, o que favoreceu o avanço de Alcolumbre sobre a Codevasf. A saída de Marcelo Moreira teria, segundo interlocutores, o sabor amargo de uma derrota para Elmar Nascimento, cuja influência sobre a estatal vinha sendo reconhecida há anos. Mesmo diante da ampliação da atuação da Codevasf para outros estados, a simbologia de sua liderança sempre esteve atrelada ao Nordeste. E a eventual nomeação de um nome do Amapá inaugura um novo e controverso capítulo na história da estatal que, até então, sempre teve sotaque e comando nordestinos.

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