Geovani Oliveira
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva enfrenta hoje um cenário radicalmente diferente daquele que marcou seus primeiros mandatos. Se antes ele teve margem para implementar programas de grande alcance social e econômico, como o Bolsa Família, o PAC e a valorização do salário mínimo, agora esbarra em um novo fator limitante: o sequestro do orçamento federal pelo Congresso Nacional. A ascensão das emendas parlamentares — especialmente as do tipo “emendas impositivas”, que obrigam o governo a executá-las — mudou completamente a lógica da administração pública no Brasil. Hoje, a maior parte dos recursos discricionários está nas mãos de deputados e senadores. Trata-se de uma inversão completa de prioridades: o orçamento público, antes instrumento estratégico da Presidência da República, tornou-se moeda de troca política do Legislativo.
Essa dinâmica trava o funcionamento da máquina pública. Qualquer presidente, seja Lula, seja outro, não consegue mais elaborar uma política pública nacional de fôlego sem ter que negociar, palmo a palmo, com um Congresso que comanda os recursos e dita as prioridades. A fragmentação orçamentária impede que o Executivo pense o país como um todo; em vez disso, prevalecem interesses regionais e paroquiais, que nem sempre dialogam com um projeto de desenvolvimento nacional. A lógica do poder também mudou. Houve um tempo em que ser deputado estadual era mais influente do que ocupar uma cadeira na Câmara dos Deputados. Hoje, no entanto, o prestígio e, sobretudo, o poder orçamentário de um deputado federal superam até mesmo os de um senador. A capilaridade política das emendas parlamentares transformou mandatos legislativos em verdadeiras gestões paralelas, com alcance direto em obras, serviços e repasses nos municípios, em muitos casos sem qualquer coordenação federal.
Nesse novo arranjo, o presidencialismo clássico dá lugar a uma forma de governo informal e desequilibrada. O país vive um “presidencialismo sequestrado”, onde o presidente ocupa o cargo, mas não detém os meios para governar. As decisões centrais sobre o uso do dinheiro público não passam mais pelo Palácio do Planalto, mas sim pelos gabinetes da Câmara e do Senado. Esse modelo não apenas engessa o governo federal como também compromete o futuro do país. Em vez de planejamento de longo prazo, temos remendos imediatistas. Em vez de estratégias nacionais, temos demandas localizadas. E o resultado se vê na estagnação econômica, na queda da confiança do setor produtivo e nas sucessivas crises institucionais que abalam a governabilidade.
O Brasil, mais do que nunca, não é para amadores. Toda vez que se acredita que o país pode encontrar um rumo de equilíbrio e prosperidade, o sistema político encontra novas formas de concentração de poder e uso do dinheiro público que aprofundam os problemas. No fim das contas, Lula — e qualquer outro que venha a ocupar a Presidência — terá que lidar com uma verdade incômoda: não governará mais com liberdade enquanto o orçamento federal estiver sequestrado pelo Congresso Nacional. E, nesse cenário, repetir o sucesso das gestões passadas é uma missão quase impossível.
Geovani Oliveira é Advogado, natural de Garanhuns, foi prefeito de Itaquitinga, município da Mata Norte de Pernambuco.
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