O discurso da governadora Raquel Lyra em Palmares, no evento Ouvir para Mudar, pode ter sido muito mais do que uma prestação de contas. Ao afirmar que “não tem uma família inteira para empregar no poder” e que governa com coragem para enfrentar o “sistema”, Raquel enviou um recado direto não apenas à Assembleia Legislativa, mas também aos grupos políticos que historicamente controlam Pernambuco.
O contexto não poderia ser mais delicado. Nos últimos meses, o governo enfrentou resistências explícitas para aprovar empréstimos estratégicos, fundamentais para destravar obras e projetos estruturantes. O impasse se prolongou, expondo fragilidades na articulação política e revelando o quanto a governadora ainda precisa consolidar sua base na Alepe. A aprovação recente das operações financeiras foi uma vitória, mas não sem desgaste.
O discurso de Palmares coloca Raquel em um novo patamar. Ela não se limita a defender sua gestão: busca construir uma narrativa de enfrentamento, de quem governa contra as pressões e interesses tradicionais. Essa postura, comum em líderes nacionais que se apresentam como “antissistema”, é arriscada em Pernambuco, mas pode render dividendos eleitorais.
O fato de se posicionar como uma gestora que não “se curva” tem força simbólica. É a primeira governadora mulher da história do estado, ao lado de uma vice também mulher, governando em um ambiente majoritariamente masculino. A mensagem é clara: Raquel não é herdeira de oligarquias e, por isso, pode se colocar como alternativa real de renovação.
Por outro lado, a estratégia exige cuidado. A Assembleia é parte essencial do processo legislativo, e o embate constante pode comprometer a governabilidade. O tom de confronto, se levado ao limite, pode isolar ainda mais o governo e reduzir a margem de diálogo necessária para aprovar projetos estratégicos.
No horizonte, o cálculo político é evidente. A narrativa de coragem, de quem enfrenta o sistema, fortalece Raquel como liderança com potencial de projeção nacional. Para 2026, em um cenário de recomposição das forças políticas locais e federais, esse discurso pode consolidá-la como figura central do PSDB e como contraponto aos blocos tradicionais que disputam espaço em Pernambuco.
Em resumo, o ato em Palmares revelou uma governadora disposta a transformar fragilidades em combustível político. Se conseguirá equilibrar coragem com articulação, só o tempo dirá. Mas uma coisa já parece certa: Raquel Lyra não pretende governar em silêncio — e seu discurso pode ser a semente de uma estratégia maior para o futuro.
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