quarta-feira, 4 de dezembro de 2024

Na Lupa, Quarta, 04/12/2024, Blog do Edney

NA LUPA 🔎 
BLOG DO EDNEY 


Por Edney Souto


REELEIÇÃO E FUNDO ELEITORAL GERA IMPACTO NA DEMOCRACIA MUNICIPAL BRASILEIRA, UM CICLO QUASE INQUEBRÁVEL 

Nas eleições municipais de 2024, o Brasil, especialmente Pernambuco, assiste a um fenômeno cada vez mais consolidado: a reeleição quase garantida dos prefeitos em exercício. Esse ciclo, que parecia estar sob ameaça em cenários de baixa aprovação popular, revela-se resistente. Gestores mal avaliados até recentemente têm encontrado nas condições atuais de financiamento público e destinação de recursos federais um alicerce que impulsiona suas campanhas e dificulta a vida da oposição.  

Os motivos são claros. De um lado, o aumento progressivo dos repasses federais aos municípios, especialmente através do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), cria um cenário de maior liquidez financeira nas prefeituras. De outro, a cota extra de recursos em setembro e o fim do Cadastro Único de Convênios (CAUC) eliminam barreiras históricas que dificultavam o acesso a verbas federais, facilitando investimentos em obras e projetos visíveis, justamente às vésperas do pleito. Para completar, emendas parlamentares enviadas diretamente via PIX garantem aos prefeitos maior poder de articulação e entrega.  

Com essa conjunção de fatores, prefeitos que enfrentavam cenários adversos há um ano surpreendem liderando pesquisas de intenção de voto com folga. A máquina pública, alimentada por esses recursos, potencializa a visibilidade de suas ações, ampliando a capacidade de influência sobre o eleitorado. O resultado é uma situação quase inviável para candidatos de oposição, que precisam disputar em condições desiguais.  

A máquina pública como aliada eleitoral

O uso da máquina pública em favor da reeleição não é novidade, mas as condições atuais intensificaram essa prática a níveis preocupantes. Prefeitos que antes lutavam contra a insatisfação popular agora utilizam os recursos recém-recebidos para financiar inaugurações, programas sociais e obras de impacto imediato, que funcionam como propaganda eleitoral disfarçada.  

Esse movimento ocorre em um ambiente onde a fiscalização é limitada e a oposição carece de recursos equivalentes para contrapor. Enquanto os gestores em exercício usufruem da vantagem da incumbência, os desafiantes encontram dificuldades para alcançar os eleitores com suas propostas, especialmente em municípios onde a estrutura de comunicação está atrelada à administração pública.  

Fundo partidário: uma arma nas mãos dos caciques

  
Outro fator que agrava a desigualdade eleitoral é a distribuição do fundo partidário e do fundo eleitoral. Concentrados nas mãos das lideranças partidárias, esses recursos são direcionados prioritariamente para candidatos que já estão no poder ou que possuem maior viabilidade eleitoral, segundo critérios internos das siglas.  

Essa prática transforma o processo eleitoral em um verdadeiro “jogo de cartas marcadas”. Candidatos da oposição, sem acesso aos fundos de maneira equitativa, precisam buscar alternativas muitas vezes inviáveis, como financiamento privado em um ambiente de desconfiança ou doações individuais insuficientes para enfrentar o peso das máquinas públicas e partidárias.  

A desigualdade na distribuição desses recursos impacta diretamente a competitividade do pleito. Eleições que deveriam ser marcadas por debates de ideias e propostas tornam-se uma disputa financeira, onde quem controla mais recursos dita as regras.  


O impacto na democracia municipal

A perpetuação desse modelo ameaça um dos pilares da democracia: a alternância de poder. A reeleição, que deveria funcionar como um mecanismo de avaliação popular das gestões, tem se transformado em um instrumento de manutenção no poder, reforçado pelo uso estratégico de recursos públicos e partidários.  

Esse cenário cria um ciclo vicioso. Prefeitos reeleitos consolidam sua base política, fortalecem alianças regionais e utilizam os próximos quatro anos para ampliar ainda mais sua influência, dificultando a entrada de novos atores políticos no cenário local. O resultado é uma democracia estagnada, onde a renovação se torna cada vez mais rara e a diversidade de ideias é sufocada.  


O debate sobre o fim da reeleição

Nesse contexto, o fim da reeleição emerge como uma solução viável para quebrar esse ciclo. Sem a possibilidade de reeleição, gestores teriam que concentrar seus esforços em governar durante o mandato único, sem a preocupação de construir uma base eleitoral permanente. Isso reduziria o uso político da máquina pública e equilibraria o jogo para os candidatos de oposição.  

Contudo, o fim da reeleição, por si só, não resolveria todos os problemas. É fundamental que seja acompanhado de uma reforma profunda no sistema de distribuição de recursos eleitorais e partidários. Uma proposta seria a obrigatoriedade de alocação equitativa dos fundos entre todos os candidatos, garantindo que cada concorrente tenha condições mínimas de viabilizar sua campanha.  


Reforma do sistema eleitoral: uma necessidade urgente

O atual cenário das eleições municipais brasileiras expõe a fragilidade do sistema político-eleitoral. A perpetuação de prefeitos no poder, o uso estratégico da máquina pública e a concentração de recursos nas mãos de poucos criam um ambiente de desigualdade que compromete o processo democrático.  

Uma reforma que inclua o fim da reeleição, a redistribuição obrigatória de recursos partidários e a fiscalização mais rígida do uso da máquina pública é essencial para restaurar o equilíbrio nas disputas eleitorais. Sem essas mudanças, o Brasil continuará a testemunhar eleições marcadas pela desigualdade e pela fragilidade democrática, onde a renovação política e a alternância de poder se tornam cada vez mais distantes.  


A urgência de mudanças estruturais

O debate sobre a reeleição e o uso de recursos públicos no Brasil precisa ser ampliado. Mais do que nunca, é necessário repensar o modelo atual para garantir que as eleições sejam marcadas pela justiça, pela competitividade e pela verdadeira escolha popular. A democracia brasileira merece mais do que um sistema que favorece poucos e exclui muitos. É hora de agir.  É isso!

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