
A
história da elaboração da lei começou, na verdade, dois anos e dois
meses antes da sanção da norma, com o lançamento de campanha popular de
igual nome em abril de 2008. A campanha teve como finalidade aprimorar o
perfil dos candidatos a cargos eletivos, estimulando os eleitores a
conhecer a vida pregressa dos políticos. As inelegibilidades da Lei da
Ficha Limpa, que punem quem comete alguma irregularidade ou delito de
ordem eleitoral (ou não), foram introduzidas no inciso I do artigo 1º da
Lei de Inelegibilidades (Lei Complementar nº 64/90) na forma de
alíneas.
Validade
A Lei da Ficha Limpa começou a vigorar no
dia 7 de junho de 2010, data de sua publicação no Diário Oficial da
União, mas somente passou a ser aplicada nas eleições municipais de
2012. Por ocasião de sua aprovação, houve grande discussão sobre quando a
lei deveria passar a valer, em razão do artigo 16 da Constituição
Federal. O dispositivo estabelece que normas que modificam o processo
eleitoral só podem ser aplicadas um ano após a sua vigência.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE)
decidiu, em agosto de 2010, que a lei seria aplicável às eleições gerais
daquele ano, apesar de ter sido publicada menos de um ano antes da data
do pleito. O Tribunal tomou a decisão ao analisar o primeiro caso sobre
indeferimento de um registro de candidatura com base em inelegibilidade
da Lei da Ficha Limpa. Porém, o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu
que a lei não poderia ser adotada para as eleições gerais de 2010,
porque isso desrespeitaria o artigo 16 da Constituição.
Já em fevereiro de 2012, o STF decidiu, ao
examinar duas ações, que a Lei da Ficha Limpa era constitucional e
valia para as eleições municipais daquele ano. Com base nesse
entendimento, a Justiça Eleitoral julgou milhares de processos
referentes a candidatos apontados como inelegíveis de acordo com a lei.
Dos 7.781 processos sobre registros de candidatura que chegaram ao TSE
sobre as eleições de 2012, 3.366 dos recursos tratavam da Lei da Ficha
Limpa, o que corresponde a 43% do total.
Alíneas
A Lei da Ficha Limpa incentiva o voto
consciente do eleitor, mostrando a importância de se conhecer o passado
dos candidatos, baseado em seu comportamento e ações. A lei tem sido a
causa do afastamento pela Justiça Eleitoral de inúmeros prefeitos e
vice-prefeitos e de convocação da maioria das novas eleições marcadas
para o preenchimento dessas vagas.
A alínea ‘g’ da Lei da Ficha Limpa é a que
resulta em maior número de registros de candidatura negados. O item
afirma que são inelegíveis para as eleições dos próximos oito anos,
contados da decisão, aqueles que tiverem suas contas de exercício de
cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável por
ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do
órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo
Poder Judiciário. Com base na alínea ‘g’, o TSE negou o registro a
candidatos que haviam sido eleitos prefeitos em outubro de 2012 nas
seguintes cidades: Pedra Branca do Amapari, no Amapá; Diamantina, em
Minas Gerais; Meruoca, no Ceará; Bonito e Sidrolândia, no Mato Grosso do
Sul; Diamantina, em Minas Gerais; Santa Maria da Boa Vista, em
Pernambuco; Joaquim Távora, no Paraná; e General Salgado, em São Paulo,
entre outros.
Por sua vez, a alínea ‘j’ torna inelegível
por oito anos, a contar da eleição, os condenados, em decisão
transitada em julgado ou de órgão colegiado da Justiça Eleitoral, por
corrupção eleitoral, compra de votos, por doação, arrecadação ou gastos
ilícitos de recursos de campanha ou por conduta vedada aos agentes
públicos em campanhas eleitorais que impliquem cassação do registro ou
do diploma. O TSE negou com base nesta alínea, por exemplo, recursos de
candidatos eleitos prefeitos nos seguintes municípios: Cachoeira
Dourada, em Minas Gerais; Primavera, em Pernambuco; Eugênio de Castro,
Fortaleza dos Valos, Novo Hamburgo e Tucunduva, no Rio Grande do Sul;
Balneário Rincão, em Santa Catarina; Pires do Rio, em Goiás, e Coronel
Macedo, em São Paulo.
Já a alínea ‘d’ define como inelegíveis,
para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como
para as que ocorrerem nos oito anos seguintes, aqueles que tenham contra
si representação julgada procedente pela Justiça Eleitoral, em decisão
transitada em julgado ou dada por órgão colegiado, em processo sobre
abuso de poder econômico ou político.
A alínea seguinte, a ‘e’, impede de
disputar eleições, desde a condenação até oito anos após o cumprimento
da pena, os cidadãos condenados, em decisão transitada em julgado ou
proferida por órgão judicial colegiado, pelos seguintes crimes: abuso de
autoridade, nos casos em que houver condenação à perda do cargo ou à
inabilitação para o exercício de função pública; de lavagem ou ocultação
de bens, direitos e valores; contra a economia popular, a fé, a
administração e o patrimônio públicos; e por crimes eleitorais, para os
quais a lei estipule pena privativa de liberdade, entre outros.
Outro item que já causou vários
indeferimentos de registro de candidatos é a alínea “l”. O texto afirma
que são inelegíveis, desde a condenação ou o trânsito em julgado até o
prazo de oito anos após o cumprimento da pena, os condenados que tiveram
os direitos políticos suspensos, em decisão transitada em julgado ou
proferida por órgão judicial colegiado, por ato doloso de improbidade
administrativa que resulte em lesão ao patrimônio público e
enriquecimento ilícito.
Já a alínea “m” fixa a inelegibilidade de
oito anos, salvo se o ato for anulado ou suspenso pela Justiça, para os
excluídos do exercício da profissão, por decisão do órgão profissional,
em decorrência de infração ético-profissional.
Outra alínea (“n”) torna inelegíveis, pelo
prazo de oito anos após a decisão que reconhecer a fraude, os
condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão
judicial colegiado, por desfazerem ou simularem desfazer vínculo
conjugal ou de união estável para evitar justamente causa de
inelegibilidade.
As sete alíneas restantes estabelecem,
entre outras, inelegibilidades para: o presidente da República,
governador, prefeito, senador, deputado federal, deputado estadual ou
distrital e vereador que renunciar a seu mandato para fugir de eventual
cassação; os detentores de cargo na administração pública direta,
indireta ou fundacional, condenados por beneficiarem a si ou a outros
pelo abuso do poder econômico ou político; a pessoa física e os
dirigentes de pessoas jurídicas responsáveis por doações eleitorais
tidas como ilegais.
A lei ainda prevê a inelegibilidade por
igual período para os seguintes cidadãos: os demitidos do serviço
público em decorrência de processo administrativo ou judicial, salvo se o
ato houver sido suspenso ou anulado pelo Poder Judiciário; os
magistrados e os membros do Ministério Público que forem aposentados
compulsoriamente por causa de sanção, que tenham perdido o cargo por
sentença ou que tenham pedido exoneração ou aposentadoria voluntária na
pendência de processo administrativo disciplinar; e os declarados
indignos do oficialato.